A inaplicabilidade do artigo 226, inciso II ao crime previsto no artigo 217-A na forma do artigo 13, §2°, “a”, todos do CP

A inaplicabilidade do artigo 226, inciso II ao crime previsto no artigo 217-A na forma do artigo 13, §2°, “a”, todos do CP


A presente abordagem teórica visa demonstrar a impossibilidade de aplicação simultânea dos dispositivos acima ante a vedação ao bis in idem.

O artigo 217-A trás o tipo penal do estupro de vulnerável, tal tipo é mormente aplicado aos casos em que o agente pratica a conduta constante do referido tipo.

Entretanto, tal tipo também tem sido aplicado em desfavor das pessoas que em razão de sua omissão, permitiram que o resultado acontecesse. Explico. O agente "A" pratica os atos previstos no tipo em face da vítima "B", sua filha, a genitora da vítima, - "C", sabendo do fato, deixa de impedir/bem como de denunciar a ocorrência do fato.

Indaga-se: Qual o resultado teórico dessa situação?

O agente "A" em tese incidirá na pena do artigo 217-A, com incidência da causa de aumento do artigo 226II, ambos do CP.

O agente "C" em tese incidirá também na pena do artigo 217-A, mas em razão de sua omissão penalmente relevante, nos termos do artigo 13§ 2º "a", ambos do CP, visto que como genitora a mesma possuía o dever legal de proteção e vigilância em face de sua filha. Quanto à causa de aumento constante do artigo 226, II, esta não se aplica ao agente "C".

A não incidência da referida causa de aumento decorre do fato da vedação ao bis in idem, uma vez que se tal causa fosse aplicada, a circunstância de ser mãe, e ter o dever de proteção e vigilância teria sido usada para atrair a responsabilidade penal em razão do dever legal, nos termos do artigo 13, § 2º a e simultaneamente para aumentar a pena em razão do parentesco.

Tal bis in idem já fora reconhecido pelo Superior Tribunal de Justiça, confira-se:

[...] Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou não ser possível aplicar o aumento de pena decorrente da relação de parentesco ou autoridade sobre a vítima ( artigo 226, inciso II, do Código Penal) a uma mulher que foi condenada pelo crime de estupro de sua própria filha, na modalidade omissão imprópria. Para o colegiado, a posição de mãe constitui elemento normativo do tipo penal, de modo que considerar essa condição para elevar a pena caracterizaria bis in idem (dupla punição pelo mesmo fato), o que não é admitido pelo ordenamento jurídico.
[...] ministro Sebastião Reis Júnior, destacou que a ré foi condenada em razão de sua posição como garantidora da vítima, o que possibilitou que ela fosse abrangida pela extensão do tipo penal do estupro.
Segundo o magistrado, tendo em vista que a condição da ré como genitora da vítima foi decisiva para a caracterização do crime comissivo por omissão, "configura bis in idem, expressamente vedado pela jurisprudência desta corte, a incidência da causa de aumento de pena prevista no artigo 226II, do CP, que determina o recrudescimento da reprimenda em metade se o agente é ascendente do ofendido, por caracterizar dupla valoração pelo mesmo fato".

A orientação acima, por ser tratar de matéria eminentemente de direito, pode ser aplicada até mesmo aos casos já encerrados.

Entretanto, é importante salientar que tal entendimento não é unânime.

Fonte:

https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/10122021-Mae-condenada-por-omissao-em-estupro-da-filha-nao-pode-terapena-aumentada-pelo-parentesco.aspx


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